Brasília. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou ontem, medidas que facilitarão o crédito imobiliário e reduzirão a inadimplência. As ações envolvem a simplificação jurídica, a criação de títulos com isenção de Imposto de Renda e o fortalecimento de garantias.
As ações entrarão em vigor gradualmente. Segundo Mantega, o governo editará duas medidas provisórias, resoluções do Conselho Monetário Nacional (CMN) e fará emendas a projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional.
Menos custos
A primeira medida envolve a simplificação da aquisição de imóveis, cujas informações passarão a ser centralizadas em um único cartório. De acordo com Mantega, a centralização reduzirá os custos operacionais e acelerará o processo de compra e concessão de financiamentos imobiliários. A medida provisória com a alteração deve sair até o início da próxima semana.
Títulos imobiliários
O governo também lançará uma nova modalidade de títulos privados para fornecer recursos para os financiamentos imobiliários. Chamado de Letra Imobiliária Garantida, o novo papel será emitido pelos bancos e terá isenção de Imposto de Renda e dupla garantia, com cobertura da instituição financeira emissora e carteira imobiliária separada dos demais ativos do banco, caso a instituições seja liquidada. Investidores estrangeiros também poderão comprar o papel.
O novo título complementará as Letras de Crédito Imobiliário (LCI), que atualmente movimentam R$ 100 bilhões. "O novo papel tem vantagens em relação à LCI porque tem mais garantias e está dentro dos padrões internacionais, o que permite que a poupança estrangeira passe a financiar a aquisição de imóveis no Brasil", disse o ministro. A criação do título depende de medida provisória.
Incentivo
O governo também anunciou um incentivo para que imóveis quitados sejam usados como garantia em qualquer tipo de operação de crédito. De acordo com o Ministério da Fazenda, a medida poderá gerar até R$ 16 bilhões em novas operações.
A mudança passa a valer a partir quando o governo editar resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN).
Consignado privado
Além de estimular o crédito imobiliário, o governo incentivará o crédito consignado privado. Atualmente, a maior parte do crédito consignado (com desconto na folha de pagamento) é concedido a aposentados e a servidores públicos.
Para os trabalhadores privados, essa modalidade de crédito não decolou, segundo Mantega, porque, muitas vezes, as empresas trocam de banco por meio do qual pagam os salários dos empregados. Agora, o tomador do crédito poderá autorizar a instituição financeira a debitar o valor da prestação no mesmo momento em que o salário é depositado na conta corrente. Hoje, a empresa desconta a parcela do salário do empregado e repassa o dinheiro para o banco que concedeu o empréstimo num momento posterior.
Medida provisória
De acordo com o ministro, na prática, a medida permite que a empresa troque de banco para o pagamento dos salários, mas a conta que recebeu o empréstimo deve permanecer na instituição financeira original. A mudança será implementada por meio de medida provisória.
O governo facilitou ainda a tomada de bens móveis (carros, caminhonetes, caminhões, ônibus, tratores e máquinas) pelos bancos em caso de inadimplência. O tomador do empréstimo poderá autorizar diretamente a recuperação do bem financiado em caso de inadimplência, dispensando ações na Justiça.
Bons pagadores
Segundo Mantega, a mudança será feita por meio de emenda a projetos de lei em tramitação no Congresso e permitirá que os bons pagadores consigam financiamentos com juros mais baixos e maior segurança jurídica.
O secretário executivo da Fazenda, Paulo Rogério Caffarelli, explicou melhor a medida: o governo decidiu simplificar a cobrança de crédito em atraso.
As instituições financeiras não precisarão mais entrar na Justiça para pedir a dedução de tributos referentes a prejuízos com empréstimos em inadimplência. A medida beneficiará operações de crédito sem garantia de até R$ 100 mil e operações com garantia de até R$ 50 mil. Acima desses valores, continua a necessidade de cobrança judicial. A nova regra depende de medida provisória para passar a valer.
Produtividade
De acordo com Mantega, as medidas contribuirão para aumentar a produtividade da economia e melhorar a competitividade do sistema financeiro.
"As medidas melhoram a regulação do crédito brasileiro. O que todo mundo quer no Brasil é aumentar a competitividade, reduzir custos e simplificar as transações", explicou.
PROTAGONISTA
Negociações com valores exorbitantes
A farmacêutica Maísa Holanda, 24, começou a procurar apartamentos com o namorado em março deste ano. As negociações com a construtora, segundo ela, eram bastante simples, com a opção de parcelar 30% do valor do imóvel que teria de ser pago logo no início. A dificuldade surge na hora de financiar os 70% restantes. Com o crédito da Caixa, segundo Maísa, seria preciso dar uma entrada de um valor alto e pagar parcelas também não muito baratas. A compra da casa teve de ser adiada.
Maísa Holanda
Farmacêutica
Quitado poderá garantir um novo financiamento
Brasília. Os proprietários de imóveis quitados poderão dar como garantia o bem para outro financiamento imobiliário. A medida foi anunciada pelo ministro do Fazenda, Guido Mantega. A origem dos recursos para esse tipo de financiamento será da caderneta da poupança, segundo informou o ministro.
"É um incentivo ao crédito garantido pelo imóvel. O cidadão que tem e quitou o imóvel e já está livre de hipoteca poderá usar como garantia para o financiamento para a modalidade que quiser cuja origem é a poupança", informou o ministro.
Mantega informou que haverá um porcentual da poupança de aproximadamente de 3% que poderão ser utilizados para esse tipo de financiamento. "O financiamento ficará mais barato. O juro ficará mais barato", disse. Mantega anunciou medida para fortalecer a garantia da alienação fiduciária para bens móveis, como os automóveis. "Teve período que aumentou a inadimplência de crédito de automóveis. Essa inadimplência já caiu, mas algumas instituições tiveram dificuldade de retomar o bem em caso de inadimplência", justificou. Mantega explicou que, agora, o governo criará uma modalidade em que o tomador de crédito pode dar uma autorização expressa para retomada do bem.
Redução do custo
Antes, as instituições tinham dificuldade para fazer essa retomada. "Quando tiver contratando o crédito, o tomador vai optar ou não por uma retomada do bem no caso de inadimplência. Com isso, ele terá mais chance de ter o crédito, porque hoje os bancos ficaram mais restritivos por causa da insegurança. E, como é mais garantido, tem chance de reduzir o custo do crédito", declarou. Mantega falou que o Brasil tem hoje o juro real em um dos menores patamares da série histórica, em torno de 4,8%. Ele lembrou que já foi de até 30%. "O juro tem que ser flutuante mesmo, ao sabor da política monetária", completou. Questionado se há expectativa de o juro ao consumidor cair, Mantega disse que as medidas barateiam custo para instituição financeira. "Quando aumenta segurança jurídica, também pode reduzir spread. Então pode diminuir juro cobrado do consumidor. Claro que isto é uma decisão do sistema financeiro. Estamos criando as condições para que isso aconteça", disse, acrescentando que é um mercado livre.
Longo prazo
As medidas de crédito são favoráveis, uma vez que estimulam a maior oferta de recursos, mas não deverão ter impacto no curtíssimo prazo, de acordo com Domingos Abreu, diretor vice-presidente do Bradesco.
"Quaisquer medidas que melhorem o ambiente de crédito como mais velocidade para retomada do bem é salutar e favorável, mas o impacto deve ser no médio e longo prazos, de um a dois anos".
Consignado será beneficiado
Brasília. O chefe do Departamento de Regulação Prudencial e Cambial do Banco Central, Caio Ferreira, explicou que as medidas adotadas ontem pela instituição vão beneficiar a concessão de crédito consignado para servidores. Na prática, a medida deve ampliar a oferta de recursos ou reduzir o custo das operações. A norma reduziu o Fator de Ponderação de Risco (FPR) para essas operações de 75% para 50%. "Não estamos alterando limites. O impacto no FPR vai reduzir exigência de capital para conceder esse tipo de operação", observou Ferreira. Quando reduzimos o requerimento de capital de uma operação tem potencial de crescimento, disse.
Ele lembrou que os bancos estão mais criteriosos e conservadores na concessão de crédito e que, por isso, não há preocupação "com efeitos sistêmicos que essa medida poderia causar".
Ele afirmou ainda que por termos operações de crédito originadas dentro dos melhores padrões, houve possibilidade de retorno das medidas macroprudenciais para o modelo usado antes de 2010. "As condições de crédito mudaram, havia excessos no sistema, alongamento excessivo e essa situação mudou. O potencial de risco sistêmico que se via antes (2010) não está se vendo hoje", argumentou.
Com a mudança nas regras do compulsório, o BC também pretende estimular a venda de automóveis. Segundo Daso Coimbra, chefe do Departamento de Operações Bancárias e de Sistema de Pagamentos, o objetivo é impulsionar as operações.
O QUE ELES PENSAM
Juros precisam de fato cair
As medidas anunciadas pelo governo são bastante positivas no sentido de facilitar a compra do imóvel e vêm de encontro a velhas queixas e a favor de pleitos do setor da construção. A centralização das certidões em apenas um cartório, por exemplo, vai conferir mais agilidade ao processo de compra. Hoje, existe uma enorme burocracia. O imóvel usado poder ser dado como garantia não é bem uma novidade, pois alguns bancos já permitiam isso, agora está oficializado. A emissão de letras imobiliárias para captar mais recursos além da poupança vai viabilizar maior volume de recursos tanto para o mutuário como para as construtoras, minha única ressalva é com o consignado. Será que os bancos vão realmente baixar os juros mesmo com mais garantias?
Marcos Novais
Presidente da Coopercon-CE
Eu só vejo vantagens nas medidas lançadas pelo governo se elas se reverterem, de fato, em juros mais baixos para o consumidor, facilitando e impulsionando, assim, a compra de imóveis financiados. Os juros praticados no crédito imobiliário já são bastante razoáveis, então eles precisariam ficar ainda mais baixos. Não ficou claro em quanto as taxas podem baixar e se isto vai ficar a cargo das instituições financeiras ou do governo. Será que os bancos vão, de fato, reduzir os juros isso? Além do que, todas essas garantias que estão sendo viabilizadas pelo poder público precisam resultar ainda em crédito mais acessível para o mutuário. O acesso à renda informal ao financiamento também poderia ser viabilizado, facilitando ainda mais a aquisição dos imóveis.
André Montenegro
Presidente do Sinduscon-CE