A Coelce está cobrando do consumidor alegados R$ 107 milhões em crédito de ICMS. Aneel autorizou o repasse. Mas juristas dizem que, como a Sefaz não reconhece o valor, caso pode ser questionado na Justiça
O reajuste anual de energia elétrica de 2014 da Coelce, de 16,55% em média, é caso de Justiça segundo especialistas ouvidos pelo O POVO. Eles argumentam que o percentual autorizado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) inclui créditos de Impostos sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) que não foram reconhecidos pela Secretaria da Fazenda (Sefaz), responsável pelo tributo. O valor é de R$ 107,8 milhões, acumulados de maio de 2003 a fevereiro de 2014, conforme mostrou a edição de ontem do O POVO.
"Como a Aneel vai desconsiderar uma decisão oficial do Estado do Ceará, que não é uma tese jurídica, é um fato? É sem sentido que a Coelce repasse isso aos consumidores", avalia Erinaldo Dantas, advogado tributarista. Para ele, cabem questionamentos no caso, no qual aponta insegurança jurídica. "Se o Estado não reconhece, cabe processo contra a Aneel e contra a Coelce", conclui.
Conforme publicado ontem pelo O POVO, o secretário da Fazenda, João Marcos Maia, diz que indeferiu pedido da Aneel para que a Sefaz ratificasse o crédito da Coelce. "Nós indeferimos o pleito pelos créditos do ICMS alegados pela Coelce. A Coelce e a Aneel haviam pleiteado e nós indeferimos".
Reajuste em 2009
Erinaldo era presidente da Comissão de Estudos Tributários da Ordem dos Advogados do Brasil Secção Ceará (OAB-CE) em 2009, quando questionou reajuste extraordinário autorizado pela Aneel. Na época, enviou ofício ao governador Cid Gomes e ao então secretário da Fazenda, Mauro Filho, perguntando sobre as mudanças.
Naquele ano, o reajuste extraordinário autorizado de 8%, mais 1,4%, a cada ano, a partir de 2010, tinha como argumento mudanças na tributação, segundo Erinaldo. "(O reajuste) Decorre única e exclusivamente, a partir de 2004, das regras de tributação do ICMS no Estado do Ceará, de responsabilidade desse Poder Executivo",dizia o ofício da OAB-CE ao Governo do Estado ao qual O POVO teve acesso.
A Sefaz, assim como ocorreu no reajuste de 2014, não reconhecera as mudanças alegadas pela Coelce, por meio da Aneel, conforme relembrou Mauro Filho. "Como pode a Aneel incorporar no seu reajuste direitos de crédito de ICMS sem ter o reconhecimento da maior autoridade fazendária do Estado? Já havia voltado atrás em 2009, mas dessa vez, mesmo com o parecer contrário, acatou", critica o secretário.
O tributarista Ciro Barbosa ratifica a insegurança jurídica do reajuste. "Esse crédito só será dívida com o reconhecimento, a homologação, da Sefaz. Não é correto o consumidor pagar essa conta. Uma ação pode ser movida contra a Aneel. Além disso, a Coelce pode entrar na justiça para reconhecer esse crédito negado administrativamente. O consumidor também pode entrar na Justiça contra o reajuste", adverte.
Para Marcio Cunha, especialista em direito administrativo, essa inclusão de ICMS foi prorrogada além do tempo, mas se foi considerado custo de energia, o consumidor de energia quem tem mesmo que pagar. "O destinatário final parece ser mesmo o usuário. A forma da cobrança é que não foi ideal. A Coelce já desembolsou esse valor ao Estado, mas o consumidor não pagou esse valor. Problema fica sendo na demora na decisão, o que onerou mais ainda", analisa.